quarta-feira, 16 de abril de 2014

Sementes


Moramos numa casa muito especial. Todos perguntam como a encontramos: mentalizando. Sério, cansamos de visitar casas nas quais não nos víamos morando. Demos um tempo e passamos a mentalizar toda noite a casa que queríamos. Uma conhecida mandou um email sexta a noite sobre a casa. No domingo viemos visitar. Era a casa de um casal muito querido pela comunidade mas que estava de mudança pra Ilha Bela.

A casa é pequena, como eu queria, tem quintal e algo a mais: um salão amplo onde eram dadas aulas de yoga. O que que eu vou fazer com esse salão? Pensei muito nisso quando mudamos.

Na despedida que fizemos antes da mudança, uma amiga querida me contava que estava trabalhando e convivendo muito com o educador José Pacheco. Fiquei maravilhada. Conversamos muito sobre filhos, criação e educação e ela me disse: “organiza a comunidade que agente vai lá!” “Uia menina, você veio aqui pra me abrir uma porta, um caminho, veio a mando das forças do universo, foi não?”

Unindo meu interesse pela criação de filhos e um espaço fanstástico aguardando uma função, resolvi promover Encontros sobre Criação e Educação pra trazer gente bacana pra falar e trocar sobre o tema e pra conhecer a comunidade onde vim parar, reconhecer pares, criar novos laços.

Em 2013 fizemos quatro encontros dos quais gostei muito muito muito, principalmente pela generosidade dos convidados.

Em 2014 a agenda tá inspiradora!

Começamos em fevereiro com a Renata Meirelles, do Território do Brincar, que trouxe sua experiência de levar os filhos pequenos para uma viagem de dois anos pelo Brasil resgatando as brincadeiras infantis. Foi muito lindo. Algo que muito me marcou foi seu relato de como seu filho mais velho, Sebastião, era quem abria as portas para o universo infantil da comunidade. Que maravilhosa essa relação entre as crianças!

Vimos também alguns vídeos e entramos nesse universo do aprender fazendo, do aprender vivendo, de como as crianças estão atentas ao que lhes dá interesse e como não há preguiça mas muita força de vontade para criar seus brinquedos.

Em março exibimos o premiado documentário “Sementes do Nosso Quintal” sobre a Tearte, não-escola no Butantã, em Sampa, liderada pela Therezita. Em seguida tivemos um batepapo com a educadora Soraia Saura, amiga querida, companheira de maternagem, que estuda o brincar e tem um olhar doce e sábio sobre a maternidade e as relações daí advindas.

Foi a segunda vez que assisti ao filme e me emocionei muito mais. Tão delicado. Pra mim fala da relação com o outro. De cuidado. De enchergar o outro. De empatia. É a partir da perspectiva da criança que Therezita fala, age, transforma. Essa amoroza porém firme personagem lidera o filme e nos guia por esse universo mágico da casa da avó, cheia de sons, cores, cheiros, bichos, coisas pra brincar, buracos pra descobrir, amigos pra fazer, momentos pra solidão, festas pra compartilhar.

Fiquei especialmente tocada com uma passagem inicial em que ela se despede da turma dizendo que aprendeu muito com eles e que teve que “estudar bastante para poder me entender  e entender vocês”. É que pra mim a maternidade tem sido sinônimo de autoconhecimento. Não posso evitar olhar pra mim ao olhar meu filho. Todo o tempo aprendo sobre mim ao me relacionar com ele.

Uma amiga pergunta, na roda de conversa pós filme, o que mais poderia fazer pela educação de seus filhos de 7 e 9 anos. Contou o quanto reduziu sua jornada de trabalho pós maternidade para estar mais com eles, sua mudança de vida, o apoio que lhes dá diariamente e, no momento, a formação de um grupo, com uma amiga, para passar valores às crianças.

Pra mim, mais do que conteúdo, o que ela passa aos filhos é seu exemplo, o carinho com que se dedica a eles, a importância que eles têm na sua vida. É isso o que fica, é isso o que eles estão aprendendo, é esse o “mais” na educação que ela pode dar a eles.

Os próximos encontros sobre criação e educação são:
27/4/2014 com Elisa Manzano, da Escola Associativa Waldorf Veredas
18/5/2014 com André Gravatá, co-autor do livro “Volta ao mundo em 13 escolas”

15/6/2014 com José Pacheco, fundador da Escola da Ponte e do Projeto Âncora

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Do pedestal


Hoje compreendi um pouco as minhas vizinhas. E desci do pedestal.

São mulheres que trabalham dentro e fora de casa. Madrugam. Fazem o serviço de casa. Deixam os filhos com avós, na creche, na escola. Trabalham o dia todo. Voltam no fim do dia com os filhos só para continuar o serviço doméstico. E gritam. Gritam muito com os filhos. O tempo todo. Os menores choram. O tempo todo. Os maiores gritam. O tempo todo.

Eu, tendo ajuda três vezes por semana, cuidando só do filhote, nunca grito com ele, dificilmente me descabelo. Mantenho a postura e a doçura, mesmo quando são só disfarce. E critico as vizinhas.

Pois hoje minha ajuda faltou. Arrumei “malemá” a casa e comecei a fazer o almoço. Miguel requeria minha atenção todo o tempo. Perdi muito a paciência. Senti muita raiva. E muitas vezes não consegui disfarçar. Levantei a voz, me irritei, fiz gestos bruscos, lamentei em voz alta.

Aí compreendi o quanto de conexão e paz de espírito são necessárias quando o cuidado com o filho não é a única atividade e há outras prioridades a serem atendidas.

É claro que nada justifica a falta de respeito, agressividade e mesmo violência com os filhos, mas me leva a olhar mais fundo, respirar com mais calma, refletir com sinceridade e cuidar muito mais da relação.


Mesmo assim, hoje desci do pedestal. E vi as vizinhas com mais humildade e humanidade.

sábado, 5 de abril de 2014

Esperar, confiar


Quantas vezes por dia eu faço algo no lugar do meu filho. Não tenho paciência de esperá-lo cumprir a tarefa a que se propôs. Só depois percebo a minha antecipação.

Agora mesmo ele derrubou dois pedaços de abobrinha pra fora do prato. Na maior concentração, após algumas tentativas, consegue pegar o primeiro. Eu, mais que depressa, recolho o segundo.

Pressa. Pressa. Pressa. Pra ir aonde? Pra fazer o que?

Que bom esperá-lo terminar o que se propôs sem interferir, sem passar mensagens desestimulantes como: você é lento, você não consegue sozinho, você precisa de ajuda.

Nada disso é verdade. Ele vai no seu tempo, na sua habilidade, superando-se, conquistando confiança, ganhando autonomia.

Paciência Clarissa! aguarde o tempo que ele chega.