Estamos saindo de um
ataque de piolhos. Começou com os meninos do condomínio que vão à
escola. Eu soube por cima, não me envolvi, mas minha cabeça começou
a coçar.
Marido não viu nada
e eu fui levando. Dez dias depois, tirei um piolho criado da cabeça
enquanto penteava os cabelos no banho. Desespero.
Vinagre, pente fino,
shampoo contra piolhos por 4 dias. Mas a coisa não diminua.
Estávamos fora de casa, viajando. Ao voltar soube que uma das
famílias havia comprado um shampoo americano tipo serial killer de
piolhos. E que era prudente ferver roupas de cama e toalhas.
Isso mexeu com meu
comodismo nato e quis acreditar que comigo não seria necessário. Na
mesma noite acordei me coçando. Passei vinagre e fui ferver
elásticos de cabelo: muitas lendeas se soltaram de lá!
A sorte, pensei, é
que ninguém mais pegou. Dois dias depois e ambos filhotes coçando a
cabeça. Desespero dobrado.
Fui atrás do
shampoo serial killer e passei no mais velho. Pente fino lotado de
piolhos e lendeas. Meu único pensamento era como me livrar o mais
rápido possível dessa praga. Como amamento, não usei o tal
shampoo, nem a bebeia.
Eu já estava
fervendo roupas de cama e toalhas e, pro meu horror, encontrando
lendeas e piolhos mortos na água. Passava o dia a vinagre ou óleo
de côco e pente fino. E agora precisava cuidar também da duplinha.
Conversando com
outra vizinha fui compreendendo a naturalidade de se ter piolhos (eu
tive na infância e até uma vez na adolescência). Podia usar o
método hard core serial killer ou ir lidando com as lendeas e os
piolhos de forma natural, usando pente fino, secador de cabelo,
vinagre, óleo de côco.
Também fui
aprendendo a reconhecê-los já que passei a ferver os pentes finos.
Fui notando os tamanhos e as quantidades. Apesar do serial killer,
dois dias depois Miguel voltou a se coçar. E dá-lhe óleo de côco
e pente fino.
Outra vizinha me
falou dos piolhos no seu bebe. De como é fácil tirá-los daqueles
poucos fios. E assim me vi, em plena praça do côco, catando piolho
da pequena enquanto a amamentava.
Fui, aos poucos,
dominando a situação. Não havia uma solução única e rápida: um
tiro só. Mas muitas técnicas e dicas, dedicação e esforço e auto
aprendizado pra lidar com a situação.
Passei também a ver
os piolhos não mais como inimigos mortais a serem exterminados, mas
como outros seres vivos em seu ciclo de vida, alimentando-se,
reproduzindo-se. Assim como as aranhas que habitam a parte externa de
casa com suas imensas teias. Assim também os gambás que já moraram
no telhado, os pássaros que fazem ninho entre as telhas, os grilos
que invadem a casa no verão. Todos parte da natureza, desse mundo,
desse planeta, vivendo, como nós.
Tem sido tão
potente essa experiência que chego a agradecer o surto. Me lembrei
do título de um livro que ainda não li, de Daniel Munduruku:
“Catando piolhos, contando histórias”. Os indígenas catam
piolhos uns dos outros, de suas crianças, e assim vão se cuidando,
se relacionando, vivendo, aprendendo, contanto histórias.
Os piolhos são
parte da vida, e aqui, apesar de não serem bem vindos, não são
mais um bicho de sete cabeças.